28 de dez. de 2008

Nietzsche.


“– O problema (...) é que sempre que abandonamos a racionalidade e recorremos às faculdades inferiores para influenciar os homens, resulta um homem inferior e mais vulgar. Quando diz que deseja algo que funcione, tem em mente algo capaz de influenciar as emoções. Bem, existem especialistas nisso! Quem são eles? Os sacerdotes! Eles conhecem os segredos da influência! Eles manipulam com música inspiradora, eles nos apequenam com pináculos altaneiros e naves monumentais, eles encorajam o desejo de submissão, eles oferecem a orientação sobrenatural, a proteção contra a morte, até a imortalidade. Mas veja o preço que cobram: escravidão religiosa; reverência pelos fracos; estase; ódio ao corpo, à alegria, a este mundo. Não, não podemos recorrer a esses tranqüilizantes, a esses métodos anti-humanos! Precisamos encontrar formas melhores de aprimorar nossos poderes da razão.
(...)
Mas sem dúvida – e Nietzsche agitou seus punhos cerrados –, você tem que perceber que não existe realidade em qualquer uma de suas preocupações! (...) Esses pobres fantasmas não fazem parte da realidade numênica. Toda visão é relativa, assim como todo conhecimento. Inventamos nossas experiências. E o que inventamos podemos destruir.
(...)
(...) Eu exulto minha liberdade. Digo a mim mesmo: “O que haveria para criar se os deuses existissem?” Entendeu o que quero dizer? (...)”

YALOM, Irvin D. Quando Nietzsche chorou. Rio de Janeiro: Ediouro, 2005. Págs 281-282.

25 de dez. de 2008

Capitu

Bentinho (Michel Melamed) e Escobar (Pierre Baitelli) na microssérie da Globo.



Capitu (Letícia Persiles)


Capitu mais velha (Maria Fernanda Cândido) e o pequeno Ezequiel.


Gostaria de registrar aqui nesse espaço minha admiração por todos aqueles que participaram na produção da excelente micro série de cinco capítulos que foi ao ar recentemente na Rede Globo. Indubitavelmente, "Capitu" trouxe algo que há muito eu não via na televisão brasileira: a coragem de inovar. Os tradicionalistas que me perdoem, mas a adaptação de Dom Casmurro não poderia ter sido mais criativa! Os cenários, o figurino, o ar circense, os diálogos (em sua maioria, originais da obra), a apresentação em forma de micro-capítulos (como no livro de Machado de Assis) e por último, mas definitivamente não menos importante, a atuação de Michel Melamed como Bentinho adulto e, claro, Dom Casmurro. Nuss...O cara é geniaaaal! Raridade no atual cenário artístico "Global".
Claro que a produção foi vítima tanto de elogios daqueles que se identificaram com a forma "modernosa" com um misto de non-sense que eles arriscaram utilizar, como de críticas ferrenhas daqueles que acusaram os produtores de terem depredado a obra de Machadão, fugindo do foco do autor que, evidentemente - bradam - não era Capitu. Bem, eu me encaixo no primeiro grupo e só tenho a elogiar a obra e, como só assisti na íntegra o último capítulo, estou muuuito ansiosa pelo lançamento da obra em DVD. Segundo a Su, isso acontecerá lá para as bandas de abril de 2009. Tomaraaa!

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É com um "quê" de vergonha que eu assumo que só após assistir essa produção que eu tive o ímpeto de pegar uma das obras-primas de Machado de Assis para ler. Confesso que sou uma vítima da literatura estrangeira, mas tomei vergonha na cara e li Dom Casmurro. E me arrependo por não tê-lo feito antes. Mais uma vez, uma obra-prima de nossa literatura e também uma das mais famosas obras literárias brasileiras no exterior.
Atualmente, estou terminando "Quando Nietzsche chorou", de Irvin Yalon, e sem um pingo de ressentimento afirmo: um dos romances mais inteligentes que eu já li! Perdoem-me os leitores excessivamente "patriotas", mas diante dos atuais romancistas brasileiros não me sinto compelida a abandonar meu "cosmopolismo literário" a não ser para os clássicos - oh, sim, tomei vergonha na fuça e passarei a prestar mais atenção nos autores de outrora além de Augusto dos Anjos e Álvares de Azevedo!

14 de dez. de 2008

Até que me provem o contrário...


Tempão que eu não posto aqui. Como sempre, recolhi-me em minha ausência. *risos
Pois bem, estou de férias e inaugurarei o cumprimento de minha promessa de posts semanais com um assunto polêmico: religião ou, se preferirem, religiosidade. Teísmo talvez coubesse melhor aqui. Ateísmo, para ser sincera. Enfim, tentarei fazer aqui um resumão dos fatos sucessivos que me levaram à atual situação: incredulidade completa em qualquer tipo de deus, divindade, ser superior, mistério, etc etc etc. Ateísmo e ponto. Ponto final.
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Tudo, como quase sempre, se inicia na infância. Meus primeiros contatos com uma religião - na verdade, já com uma penca de "religiosidades" diferentes - ocorreram logo que me entendi por gente. 1) Catolicismo (minha mãe se dizia católica, mas me levava à missa apenas no Natal e/ou na Páscoa); 2) Cristianismo protestante (uma parte dos meus parentes insistiam em me levar para os cultos jovens); 3) Umbanda (vez em quando minha mãe também me carregava para umas festas no terreiro do lado da nossa antiga casa. O batuque era legal, as fantasias dos tais orixás eram legais também, mas a hora melhor era a hora da comilança. Pois sim, veeeery religious). Conclusão: nunca tive uma orientação firme sobre religiosidade. Só para terem uma noção, até meus sete anos mais ou menos eu acreditava piamente que a "cara" de Papai Noel que minha mãe deixava o ano todo pendurado na parede do corredor era a "cara" de deus - pô, o cara era barbudo, grisalho e tinha aparência de vovô legal...Só podia ser ele o tal do deus que dá tudo o que a gente implora nas orações!
Com dez anos eu entrei na tal da catequese que todo mundo tinha que fazer para poder tomar o sangue e comer o corpo de Jesus. Poxa, eu gostava. De verdade! O padre era muuuito engraçado, sabia como fazer a gente entender o quanto Jesus é bonzinho para criancinha boazinhas (o que ele costumava fazer com as criancinhas não-tão-boazinhas-assim eu já não sei porque o padre nunca tocava nesse assunto. Presumi que iriam para o inferno, coitadas), tinha um monte de brincadeiras e eu até coroei Nossa Senhora vestidinha de anjinha. É, mas eu me mudei. Minha vida deu uma reviravolta tremenda que não convém detalhar aqui. E eu fiquei anos sem pisar numa igreja. Ah, claro, dava para continuar perturbando o tal do deus de vez em quando, sempre que eu lembrava ou que precisava de algo. De fato, eu só me lembrava quando precisava pedir algo. *risos. Com catorze anos eu consegui terminar a tal da catequese por conta própria, tipo, fui na Igreja pertinho dos prédios onde eu estava morando, me informei e comecei por mim mesma. Eu tinha que saber como era o tal ato religioso (e canibal) de comer o corpo de Jesus e tomar seu sangue. Nada mal. Apenas falso. Tãããão falso, desejo enfatizar. Não é o mesmo pedaço de pão sem fermento molhado no vinho que vai limpar a alma de uma reles adolescente que fala palavrão e responde mal à mãe e, ao mesmo tempo, de um assassino, de um estuprador, de um ladrão...Ai ai, "Santa" hipocrisia. E eu pensava comigo mesma: "Nada disso pode estar certo!"
Quinze anos: virei bruxa.
Nada de coven, nada de dogmas, nada de gente opinando na minha fé. Era eu e a suposta Grande Deusa e ponto. Iniciei-me por conta própria. Estudava e aprendia mais e mais a cada dia também por conta própria. Ah sim, para os curiosos eu faço uma revelação: nessa época que eu ganhei o nome Sara Sheeva. Era meu nome dentro da Wicca (sim, eu seguia predominantemente os preceitos da Wicca). Depois que eu usei o nome "Sheeva" na minha primeira personagem de rpg que acabou virando apelido de vez (até minha mãe me chama assim hoje em dia! ¬¬')
Qualquer assunto sobre religião sempre me interessou e me interessa muito. Eu pesquisava muito sobre tudo. Queria conhecer para criticar, mas também para tirar lições sempre que possível. Curiosa que nem gato vira-lata, cheguei até a me aproximar do " lado negro da força", se é que vocês me entendem. Daí eu percebi, amigo, que se a parte boa dessa coisa de existência divina já é duvidosa, que dirá a parte má. Ai ai...
Como algum sábio sábio de verdade falou certa vez, "quem muito procura, acha". E eu achei. Achei em mim a minha profunda incredulidade que sempre esteve presente, mas que eu tinha receio de aceitar. É curioso porque chegou um momento em que eu estava tão obsessiva por crer em algo que fizesse sentido que tudo passou a simplesmente não fazer sentido nenhum. Na verdade, na dessas baboseiras religiosas fazem sentido. Eu queria crer em algo porque todo mundo assim o fazia sem muitas complicações.
Dois grandes problemas: eu não sou muito apta a crer em coisas que não façam sentido. E eu não sou todo mundo.
Não vou perder meu tempo aqui citando os muitos motivos que me levam a crer (estranho usar essa palavra nesse sentido, mas não pude evitar) que a existência de seres ou coisas divinas é muito improvável. De fato, estou certa até de que qualquer um que pare para pensar com um pingo de honestidade verá o mesmo que eu vejo: a triste e dura realidade de que somos animais como todos os outros, que somos a fase evoluída de algo muito parecido com um macaco feioso pensante, e que, infelizmente, morreremos e serviremos de adubo, como o cachorro do vizinho, como a borboleta colorida que está pousada naquela folhinha e como a própria folhinha em si. Morreu já era, meu bem. Alimento de minhoca, adubo para terra - pense positivo: tem gente que acredita que você deveria ficar numa sala escura e fria cheia de gente se lamuriando no seu ouvido, um tal de Purgatório.
Se eu me sinto desamparada, sentindo que a vida não tem sentido e coisa e tal? Cara, fico sim. Frequentemente. Mas fazer o que? Acreditar numa meia dúzia de mentiras que mais fazem piorar o mundo do que melhorar? Não mesmo. Já disse, não sou apta a acreditar em coisas fantasiosas. As fantasias foram feitas para vermos em filmes ou teatros e para lermos em livros (falando nisso, parabéns aos autores das Bíblias cristã e satânica. Literatura de qualidade com muitas lições de vida, principalmente a primeira. Ainda não li o Corão, mas pretendo ainda fazê-lo). Também vivo me perguntar "why? why? why?" para uma série de coisas, mas nada que me obrigue a acreditar no "nada" só para me sentir mais confortável por breves instantes, até que as perguntas sem respostas voltem a me atormentar.
Retomando, o que aconteceu, em suma, foi isso mesmo: olhei para mim mesma e falei, "cara, você tem força suficiente para assumir que não há nada para te acudir. A vida é essa mesma e não adianta contar com nada que não seja advinda de você, do seu eu, ou das relações cativadas com outros iguais a você. O que se tem por certo e justo deve ser feito não porque você almeja um paraíso longínquo, mas porque você é uma pessoa sensata."
Não que eu seja aquele tipo de incrédula militante que quer converter o mundo todo a uma não-fé. Sinceramente, não tenho saco para fanatismos de nenhum tipo, muito menos desse. ADO-A-ADO cada um no seu quadrado. Mas cá entre nós, a fé em algo superior não é demonstração de humildade coisa nenhuma! Não passa de um medo de assumir a pura responsabilidade por seus atos uma vez que esses, na realidade, não estejam subjulgados a nenhum paradigma, mandamento, lei, etc. Como dizia um outro sábio sábio para caramba, "liberdade implica responsabilidade". Ninguém quer responsabilidade. É mais fácil se corroer na culpa ou se privar de certas coisas simplesmente porque "deus não ensinou assim" ou porque "deus castiga". Castiga naaada! Nada acontece porque deus ou seja-lá-o-que-for quer. As coisas acontecem porque a vida é essa (sim, todas essas coisas que você vê ao seu redor, todos seus erros e acertos, todos os erros e acertos dos outros, todo o bem e o mal entrelaçados na subjetividade de cada um e de cada situação).
Concluindo: sou atéia sim, meu amigo, até que me provem ao contrário.
Milênios vêm, milênios vão...e ninguém jamais conseguiu. Por que será?

*OBS: isso ("Por que será?") realmente foi uma pergunta. Quem souber o por quê, favor, deixar via comentário, e-mail ou sinal de fumaça.
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Enfim, é isso...Queria ter sido mais sucinta, mas quero um desconto por já ser mais de uma da manhã e por eu ser uma moça proletária que precisa dormir cedo para aguentar o tranco. Prometo depois retomar o assunto e outros vários assuntos que tenho em mente para abordar aqui. Esse tema foi inspirado no post da Mila e nas nossas conversas de portão, onde vira e mexe a gente descobre que nossas neuras são assustadoramente parecidas.